segunda-feira, 9 de agosto de 2021

A emergência da figura do pai - Michel Zaidan


 





A emergência da figura paterna, em nossa civilização, é tardia. As sociedades primitivas eram matriarcais. A educação das crianças era entregue ao tio materno, e o pai biológico não tinha ascendência sobre os filhos naturais. A concepção biológica dos filhos e filhas era atribuída aos espíritos que, periodicamente, fecundavam as mulheres. A descendência era matrilinear. As mulheres mandavam; os homens obedeciam. Até o surgimento da família monogâmica e patriarcal, as coisas continuaram assim. A partir da ciência do seu concurso genético, os homens passaram a mandar.  Em lugar do afeto e do cuidado, surgiu o temor e a obediência. O amor paterno passou a ser condicionado pela certeza genética dos filhos. Instituiu-se a monogamia, o incesto e o tabu da virgindade. Da horda, passamos à família patriarcal, com a sujeição da mulher, dos homens e da natureza. O ser-do-cuidado, que caracteriza a essência do amor aos filhos, as pessoas e a natureza é de índole feminina, não masculina. E a evolução psicológica da humanidade passou pelo assassinato psicanalítico da figura paterna e a superação do sentimento de culpa dos filhos.

Mas perdurou na espécie como memória do parricídio original. De lá para cá tornou-se o complexo de édipo que se trasladou nas ditaduras e revoluções sem fim. O sentimento ambíguo de amor e ódio dos filhos em relação aos pais levou-nos ora a amá-los e admira-los. Ora a querermos substitui-los.

A civilização do futuro deve  diluir   a figura paterna nas relações  de amor e cuidado de uns com os outros. Produzindo uma civilização mais feminina, a par das mudanças que vem ocorrendo com a própria organização familiar: famílias monoparentais, homossexuais, comunitárias, A figura paterna será relativizada em prol de uma comunidade afetiva que cuide e proteja todas as crianças, não só nossos filhos.


Sem comentários:

Enviar um comentário