quarta-feira, 31 de março de 2021

TELA DE WHATSAPP (recebido) de Gonzaga Mattos - 328 anos da cidade de Curitiba

 

Curitiba comemorou ontem seus 328 anos. Foi também dia de comemorar os 14 anos dessa homenagem que me foi prestada pela Câmara Municipal de Curitiba:



Resposta de João de Marques:

Embora tarde, Parabéns. As homenagens são se apagam.


(de Madalena Ferrante Pizzatto)

RETRATO DE CURITIBA

 

Minha amada, gelada, cinza e nublada,

de inverno com o céu azul translúcido,

outros muitos bruscamente escurecidos.

Um sol tímido algumas vezes brilha aqui.

 

“Daí você já sabe” aqui tem leiTE quenTE. 

É a queridinha do vampiro e polaquinha, 

do Poty, da Elena Kolody e Leminski.

da “vina”, do“penal” do “piá” e Au Au.

Cidade Sorriso da Rua da Flores

dos teatros, dos Natais e musicais.

 

No domingo tem Tangua, Tingui e no Barigui.

Porque é linda e Santa a Felicidade,

Eu te envolvo com meu abraço 

Curitiba, é muito bom viver aqui !


De João Marques:

Penso, Adélia, como é bom  Curitiba... viver esse aqui, muito bom viver aqui, onde a existência são esses monumentos de se ver nos ares e nas praças, Rua das Flores de ir, passagem de ficar, sem espinho, e sem outra rua no meio, é só de pisar pela calçada estendida entre os pontos cardeais; Curitiba, a poesia te declara, e fica  nos olhos dos curitibanos... dos poetas das névoas,  e veste o frio e sobe os pinheirais. Retrato de Curitiba, geografia da alma dessa cidade, e parabéns a Madalena, que de Pizzatto nunca vi Ferrante mais leve.



BBB NOS DÁ A SOLUÇÃO - Gonzaga Mattos


 





À medida que o tempo passa ou a qualquer desarranjo na condução da política, aumenta o número daqueles que dizem “eu votei nele para que o outro não ganhasse”. Afastam assim o carimbo da testa com a inscrição “Você é o culpado”.

E isso não é de agora. Desde que me conheço por gente, desde aquele tempo em que percorria as seções eleitorais para pegar cédulas, esparramadas pelo chão, para brincar de eleições. Nada mudou. Sempre fica no ar o desapontamento do eleitor diante dos erros ou trapalhadas de seu representante.

Hoje resolvi contrariar aqueles que se dizem indiferentes ao BBB... assim como os que se travestem de progressistas e socialistas para serem vistos como intelectuais. No Jornalismo e nas Artes é prática recorrente.

Pois bem... ouvi dizer que o Big Brother é o microcosmo do mundo exterior. Exceto Covid, ali tem de tudo: hipocrisia, traição, falsidade, conversa fiada e, às vezes, demonstrações de amizade sincera. Representa o oásis nesse deserto de boas notícias da televisão. Você recebe uma carga imensa de informações sobre a Covid e seus efeitos, com UTIs superlotadas, velórios sem cortejo e muito “dá cá o meu” na hora de pleitear ajudas aos cofres públicos. Daí entra na programação o BBB e você não ouve falar uma vírgula sobre a pandemia. Minutos de desafogo!

Vejo, portanto, o BBB. E tenho “aprendido” muito. Vi, por exemplo, uma menina bonitinha perguntar, numa prova, qual era o significado de Ambição. Simples ignorância, metalinguagem, metáfora ou qualquer outra coisa do gênero? Será que, ao demonstrar tal desconhecimento, ela não estava passando mensagem ao telespectador sobre a tênue linha que separa a virtude do pecado? Adão e Eva não destruíram o Paraíso em razão da ambição? Em contrapartida, crescer, prosperar, progredir não têm, em si, muito de necessária ambição?

A lição maior, contudo, é para mim, dirigida aos que definem a regra do processo eleitoral. Da casa do BBB saem os condenados pelos eleitores, o público telespectador. Não seria melhor em nossas eleições votarmos em quem deve sair do pleito. Mais votos – representando a condenação pelo passado político do candidato – fora! Ao final, o menos votado seria consagrado vencedor.

Assim, seria a legítima vitória do Menos Ruim. Ou seja, acabava com essa história de ser enganado por promessas, planos oníricos ou ares de quem possa a vir ser bom.

Combinava perfeitamente com o quadro político brasileiro. E as manchetes pós-pleito seriam verdadeiras e de acordo com a realidade política: “Fulano venceu hoje a eleição como o Menos Ruim”, para a alegria do macrocosmo nacional.

GERALDO FREIRE O COMUNICADOR DA MAIORIA - Manoel Neto Teixeira

 








     É por demais abrangente e expressivo o título do livro do e sobre o radialista Geraldo Freire: “O que eu disse e o que me disseram”. A obra, em segunda edição, 486 páginas, Companhia Editora de Pernambuco-CEP, 2018, coautoria de Eugênio Jerônimo, colaboração de Gildson Oliveira e Daniel Bueno. Xico Sá, jornalista e escritor, assina o “Breve prefácio de um admirador de longa data”, o qual salienta, entre outras tiradas: “Noves fora a brincadeira, que figura tampa de Cruch, que arretado, que radialista da gota serena, da moléstia dos cachorros, da febre do rato, para citar apenas algumas expressões populares que tratam da grandeza e do superlativo da nossa gente nordestina. E viva a fala do povo, a linguagem da “poeira”, algo tão exaltado e defendido por esse gigante da comunicação do país”

No primeiro capítulo, sob o título “A improvável vida de Geraldo Freire, Eugênio Jerônimo discorre sobre as origens e contexto familiar do radialista, cujos pais – Lauro Gomes dos Santos e Odília Freire dos Santos -, as irmãs Maria e Adalgiza, migram do sertão cearense, fins da década de 40 do século XX, em busca de melhores condições de vida no município de Pesqueira, agreste de Pernambuco. A criança Geraldo Freire, com apenas cinco anos de idade, fica órfão de mãe e daí enfrentaria toda sorte de dificuldades e desafios, materiais e psicoemocionais. Recebe as primeiras lições na escola rural de Fundão de Dentro, com a profa. Sebastiana, de quem chama a atenção pela rapidez com que assimila o aprendizado das primeiras letras e os deveres prescritos: “Em apenas uma semana já lia a cartilha de frente para trás e de trás para a frente”. Tinha oito anos. “As pessoas identificavam nele um talento superior”, confessa a profa.

 A primeira odisseia do menino GF estava próxima: aos nove anos, arquiteta aquela que seria decisiva na sua vida: foge da casa do pai e madrasta, no sítio Canela de Ema, zona rural de Pesqueira, embarca no trem em Pesqueira rumo ao Recife, à procura da casa da tia, Ciló, que já havia recebido suas irmãs após a morte de sua mãe. A residência ficava no bairro de Água Fria. Mas, qual não o susto da tia ao ouvir alguém bater na sua porta em plena madrugada. Embora reticente, abre a porta e se depara com o menino sobrinho GF. Que susto e que alegria. O acolhimento imediato, com os afagos quase que maternais.

Irrequieto o menino GF busca logo e encontra trabalho, apesar da pouca idade, em pequenas mercearias e lojas estabelecimentos comerciais. À época, a Justiça do Trabalho fazia “vistas grossa” permitindo a mão de obra de menores. Depois das primeiras experiências, bate por último na porta da Agência de Propaganda do Sr. Hermes de Melo, no centro do Recife, consegue emprego e onde ensaia as primeiras incursões no mundo da publicidade. A paródia “La Bamba” foi a sua primeira produção.

O publicitário Hermes de Melo mantinha um programa na rádio Capibaribe divulgando as notícias das atividades sindicais no Recife. Onde realizada também entrevistas com lideranças do setor. O menino GF tinha a incumbência de conduzir o gravador acessórios para o Sr. Hermes realizar as entrevistas. Surge daí o seu primeiro encanto com os bastidores do rádio, as entrevistas, locução e produção de textos.

Certo dia, GF chega aos estúdios da Capibaribe levando o gravador de fita de rolo na cabeça para a entrevista que o Sr. Hermes faria, naquela tarde, com o interventor do Sindicato, um capitão de mar e guerra (já em pleno regime militar, pós 64). A entrevista estava marcada para as duas da tarde. O tempo foi passando e nada de o Sr. Hermes chegar, o que veio a acontecer somente às 18 horas. Foi logo perguntando como iam as coisas, na sede do Sindicato dos Tecelões, e qual não o susto ao ouvir do menino Geraldo Freire: “Eu fiz a entrevista, senhor Hermes”. “O que, menino? Voce fez a entrevista? Deve ter ficado uma merda”.

Depois do susto, a surpresa agradável: Hermes liga o gravador, escuta a entrevista, gosta e logo aprova o gesto aparentemente precipitado do menino.  Começa daí a mudar o panorama na vida de GF, tinha 14 anos: recebe a incumbência de continuar auxiliando o Sr. Hermes na realização das entrevistas, substituindo-o quando necessário. Recebe a credencial de “repórter amador de rádio”. Um novo e definitivo desenho começa na vida do adolescente GF. Surgem as primeiras oportunidades para mostrar suas características e modus operandi.

Foi reprovado em dois testes para locutor nas rádios Capibaribe e Continental, por revelar alguma dificuldade na pronúncia de palavras em inglês e francês.  Mas não desistiu. JÁ estava fascinado com os bastidores da radiodifusão. Era sua praia. Já tendo demonstrado jeito para colher entrevistas, como “repórter amador”, nos ambientes sindicais e esportivos. É convidado pelo famoso apresentador Reinaldo Filho para o substituir numas passagens de Natal e Ano Novo, com a incumbência de anunciar apenas a “hora certa”. Os caminhos começavam a se abrir.

Seu primeiro emprego como locutor foi no Sistema Globo (Rádio Repórter), era dezembro de 1968. Depois, rádio Capibaribe, onde cria um laço com os motoristas de táxi, obtendo 90% de audiência da categoria. Atuou em todas as emissoras de rádio do Recife, inclusive na Rádio Olinda, mantendo em todos os programas a sua marca, o jeito próprio de fazer e dizer, entremeando com frases de efeito, “linguagem rasgada, com uma semântica erótica, marcada de palavrões, que deve ser explicada em conjunto com as outras habilidades do comunicador”, salienta Eugênio Jerônimo.

Em 1971, deixa o Sistema Globo e vai para o Sistema Jornal do Commercio, onde atuou como repórter de pista nas coberturas nos estádios de futebol. Aí, aprontou muitas, dentro e fora do gramado. Integrou a equipe de Darcy Lago, na TV Jornal, com o cognome de “O repórter pra frente”. Na Rádio Jornal apresentava o programa “A musicalíssima é uma parada”, líder de audiência no horário. Mesmo assim, é demitido pela direção da empresa e é recebido de braços abertos na Rádio Olinda, pelas mãos do diretor de programação, Roberto Queiroz. Muda o nome do programa da Jornal, agora “A disparada sucesso”, conquistando a liderança de audiência no horário. Fazia ainda um comentário sobre futebol o “Bate-bola”

Volta para a Rádio Repórter, 1973, onde cria, juntamente com o radialista Jota Ferreira, um quadro com o nome de “O tribunal da cana”, com a participação de quatro moradores de rua que “davam plantão” nas rampas do Hospital da Restauração, por Jota Ferreira transitava nas coberturas diuturnamente. Esses personagens reais eram Piroquinha, Dadi, Marreco e Exu Cultura. A conversa com os quatro eram puxadas e alimentadas por Geraldo Freire, novamente líder de audiência no horário, início das manhãs.

Outro quadro também de grande audiência é concebido pela mesma dupla, Jota Ferreira e Geraldo Freire, foi “A perna cabeluda”. Uma ficção que terminou se espalhando qual “realidade” nos quatro cantos do Recife, dando muita dor de cabeça nas delegacias de polícia onde os dois radialistas eram sempre intimados a dar “explicações”.

 

                        O QUE EU DISSE E O QUE ME DISSERAM

Geraldo Freire abre o seu capítulo comentando e justificando o seu linguajar, personalíssimo, pois não se tem notícia de estilo semelhante na radiodifusão brasileira. A conversa inicial com o seu patrão, diretor-presidente do Sistema de Comunicação Jornal do Commercio, Sr. João Carlos Paes Mendonça, sua curiosidade com o linguajar de GF. Este  lembrou uma conversa que manteve com um ouvinte dos seus programas que insistiu em saber algo sobre o seu patrão. A conversa foi por telefone e, entre uma colocação e outra, para encurtar o papo, GF disse: “Eu te digo mais: ele tem muita sorte, pois em tudo que toca faz sucesso. Senti que o cara ficou mais calmo e dei a pancada final: “Eu sou doido que Paes Mendonça me coma, porque eu vou ficar cagando ouro e dou pra tu um par de alianças. O camarada deu uma gargalhada e eu aproveitei para desligar o telefone e continuar trabalhando”.

Quanto ao seu linguajar, recheado de palavrões, GF registra, entre outros, os seguintes: o tirinete; pra caralho; nem fudendo; aquele filho pentelhado de 17 anos; porra nenhuma; puta que pariu; vai tomar no olho do cu; fodeu de vez; foda-se; nem fudendo”.

A segunda parte do livro compõe-se ainda dos seguintes capítulos: começando o tirinete; gente importante; a bola que eu vi rolar; na cozinha do rádio; a cultura do povo; pesquisas, estudo e palpites; para os curiosos; depoimento do diretor do Ibop no Recife.   

 No capítulo “gente importante”, registra tiradas ontológicas com um leque de celebridades de todas áreas do conhecimento, da política, da música e das artes em geral, que passaram e continuam passando pelo seu programa, líder de audiência na Rádio Jornal, onde continua militando há mais de 30 anos.

(Manoel Neto Teixeira, jornalista e professor, membro, dentre outras, da Academia Pernambucana de Letras Jurídicas, autor de mais de uma dezena de livros). E-mail: polysneto@yahoo.com.br.




Se só te resta uma semana de vida... William Santiago







     Acabei de rever um vídeo da geriatra Ana Cláudia Quintana Arantes e não consegui deixar de pensar em escrever este texto. Aliás, antes disso, penso no Youtube, Google e mídias sociais. Temos hoje, refeita, a incinerada biblioteca de Alexandria com todo o conhecimento disponível ao alcance da mão. E é na web, você não carrega peso nem pega alergia com papel velho. Claro que temos uma imensa quantidade de lixo e de inutilidades no ambiente virtual, mas garimpando se encontram tesouros. Esse vídeo é um deles.

     A narradora, com voz suave, nos fala da morte e nos propõe um exercício ao final: escreva os seus 5 maiores problemas de hoje. Depois pense que você vai morrer na próxima semana. Volte a pensar nos problemas e vai ver que não são tão grandes assim.

    Isto posto, recordo o dia em que meu filho Iúri me ligou para contar que o amigo João Batista de Freitas, o Jonba, tinha apenas três meses de vida. Poeta, contador de piadas, escritor, advogado, técnico de laboratório, grande cozinheiro, grande anfitrião, o que o Jonba não era? Pois ele recebeu a notícia de que estava com fibrose pulmonar e só tinha aquele limitado crédito existencial. Teve até mais tempo do que o proposto no exercício da geriatra.

     Recebi a notícia e, acovardado, relutei bastante até tomar coragem e viajar de Brasília a Pitangui para compartilhar talvez os últimos dias de uma pessoa que conhecia desde criança. Jonba também saiu de nossa cidade natal, trabalhou por muitos anos em Trombetas, PA, e fomos nos encontrar de novo em Pitangui, na metade dos anos 80. Daí, quase sempre no quintal de sua casa, no caminho da bica da Gameleira, continuamos uma produção literária e musical, compartilhada pelo também saudoso Reinaldo Pereira de Souza, o Rohr, nosso parceiro, músico excepcional.

     Estive com Jonba todas as manhãs, durante uns 10 dias. Não toquei no assunto principal, a morte anunciada. Quando ele beirava o tema, eu não dava liga. Buscava outras pautas. Procurei incentivá-lo a colocar na web os seus escritos, principalmente os “causos” reunidos sob o nome de “Beira de Balcão” e também poemas. A meu pedido, criou sua página no Recanto das Letras e postou apenas dois poemas, que podem ser acessados pelo singelo nome do autor: Jonba. O tempo foi curto para isso, sua produção é imensa.

     Estava em pleno processo de despedida quando o visitei. Contratou um motorista para levá-lo pela cidade aos lugares queridos. Não sei e nem perguntei, talvez agora pergunte aos familiares como ele se comportou nesses últimos dias. Com a respiração cada vez mais prejudicada, passou a usar o oxigénio portátil a maior parte do tempo, inclusive nos últimos encontros musicais em sua casa ou na casa do irmão José, onde o sobrinho Fábio Freitas já se anunciava como um herdeiro do tio.

     No 1º de setembro, seu aniversário, já estava no hospital. Liguei a pretexto da data e, consternado, ouvi sua voz fraquinha e respiração angustiada. Ainda fiz uma brincadeira:

     - Que situação, Baez, passar o aniversário no hospital, hein? -  Pura falta do que falar, mas ele respondeu qualquer coisa ininteligível. Foi a última vez que ouvi sua voz.

      Partindo dos parâmetros da dra. Ana Cláudia, até que ele aproveitou bem o tempo que lhe deram para meditar e despedir-se. Penso nisso sempre e agora sigo essa diretriz para redimensionar meus problemas. Estou na mesma gangorra que a maioria da Humanidade, especialmente nesses tempos terríveis da Nova Peste: quando assolado por problemas, penso na semana que me resta e tiro tudo de letra. E vou seguindo. 

Eis o link do vídeo citado:

https://www.youtube.com/watch?v=d5aKY_ozmBc

sexta-feira, 12 de março de 2021

Claro encanto - João Marques


 






O olhar primeiro de te ver

foi meu olhar por toda vida

o instante eterno

da claridade dos meus olhos

o sentimento reflexo

na profundeza da alma

 

amor da essência pura

da existência de quem olha

e vê como vi o teu ser

ornado como fica a flor

das cores da respiração

e da vida que aflora

 

que ares, que perfume

se movem em teus gestos

e nesse esvoaçar dos cabelos

e nos grandes olhos um lume

das luzes que no céu eu vejo

encantado do teu brilho eterno

 

foi o primeiro e não deixou

nunca mais de ser o olhar

o meu deslumbramento

a vida, o tempo, a alegria

de todo o dia logo cedo

contemplar dois sóis..

Garanhuns perde uma grande mulher. - João Marques


 







      Ao lado das belezas de Garanhuns, considero a existência aqui de grandes mulheres. Muitas, que não dá para nomear todas. Algumas, relembro. Dona Almira, professora; Dona Sílvia Galvão, esposa de Celso Galvão; Luzinette Laporte, escritora; essas três, mais conhecidas.

      Agora, Emilia Valença, esposa de Givaldo Calado. Grande mulher, pela sua ação social, política, e simpatia. Filha do inesquecível Amílcar da Mota Valença, um dos maiores homens de Garanhuns. Emília fará muita falta certamente. Sinto realmente o seu afastamento de Garanhuns. E peço a Deus a sua glorificação, e ao povo de Garanhuns que nunca seja esquecida a sua memória.



FAKE NEWS (VELHAS/NOVAS MENTIRAS) - Manoel Neto Teixeira


 







Fenômeno inerente à própria condição humana a mentira, agora fake news, é praticada desde que o mundo é mundo, suas origens se perdem nas dobras do tempo. Além de fazer parte do cotidiano das pessoas, está inserida no contexto das narrativas históricas, nos códigos penais, na literatura e no folclore de todos os povos.

Há um cem número de definições sobre a mentira, a cargo dos estudiosos e pesquisadores do folclore e da cultura popular. Entre estes, a do consagrado folclorista Luis da Câmara Cascudo: “É a liberação dos limites da lógica e participadas estórias mentirosas, pilhérias, anedotas, casos estupefacientes”.

Consta inclusive nos relatos bíblicos, quando o apóstolo Pedro nega por três vezes conhecer e ser próximo de Jesus.

Com o nome “moderno” de fake news, a velha/nova mentira continua mexendo com o cotidiano das pessoas e das sociedades em geral, desenvolvidas e subdesenvolvidas. Agora, com o fenômeno da Internet, é incorporada nas redes sociais, causando uma crescente onda de sensações, gerando uma onda de desmentidos, de disse-me disse-me sem fim, inclusive frequentes processos judiciais.

    Desde os rincões do nosso imenso país, dos campos às cidades, a mentira circula qual “necessidade” de muita gente, nas feiras livres, nos salões dos antigos barbeiros aos salões de beleza das área urbanas (grandes e pequenas), os contadores de estórias têm cadeira cativa, alimentam expectativas e o imaginário popular.

Há os que classificam a mentira com duas facetas: a “mentira verdadeira”, aquela que calunia as pessoas causando-lhes danos morais, o que gera processos judiciais, e a “mentira branca”, sem causar danos nem atingir a reputação de ninguém. São estórias hilariantes, que aguçam o imaginário das pessoas, contadas por figuras que fazem parte do folclore e da cultura oral das comunidades.

A mentira está presente não apenas na vida real, no cotidiano das pessoas, mas também se presta como temas para as criações literárias dos grandes escritores, principalmente no terreno da ficção, movimentando a cena teatral, o cinema e a televisão. Os contadores de estórias, chamados “mentirosos profissionais”, têm cadeira cativa nos programas de televisão.

Abarcando os vários aspectos da questão, foi publicado, em 2001, inciativa da editora Goiânia Kelpes, o livro sob o título Algumas Pernas Curtas da Mentira, reunindo ensaios de escritores e pesquisadores de destaque na cena cultural de Pernambuco: Mário Souto Maior, Manuel Correia de Andrade, Renato Phaelante e Getúlio Araújo.

Cada um registra e comenta os vários aspectos da mentira, sua repercussão desde as narrativas históricas até casos envolvendo figurões da política e do folclore. Na literatura de cordel, circulam centenas de folhetos contando desde fatos e figuras históricas até projeções na cena ficcional, como o folheto sobre a chegada de Lampião no Inferno.

O escritor Mário Souto Maior afirma, no capítulo “a mentira na linguagem popular”: “Na boca do povo – legendas escritas nos para-choques dos caminhões, trovas, culinária, letras da música popular brasileira, crendices – a mentira encontra sua guarida cotidiana como resultado da afirmativa de que é o povo quem faz a língua de uma nação. Somente depois que o povo cria as palavras é que os lexicógrafos arrumam-nas em estudos linguísticos e nas páginas dos dicionários, passando, a partir de então, a pertencer à língua falada e escrita de sua gente”.

O autor citado admite que existindo em todo mundo, na totalidade das classes sociais, branca ou verdadeira, a mentira, não podendo ser a exceção de uma regra universal, também participa dessa linguagem popular, de ambas as maneiras, contribuindo, assim, para seu enriquecimento.

O campo da historiografia é dos mais férteis para a deturpação dos fatos e a inserção de mentiras. O professor Manuel Correia de Andrade diz, no ensaio sobre equívocos da história do Brasil, serem inúmeros os equívocos e omissões, por parte de alguns historiadores, sobre fatos e acontecimentos que marcaram a mudança de regime Império para a República.

Por sua vez, o pesquisador Renato Phaelante comenta sobre a mentira na discografia da MPB, um terreno fértil. Cita o poeta Mário Quintana para quem “a mentira é uma verdade que se esqueceu de acontecer”. Pisa em outro terreno igualmente fértil, para disseminação da mentida, que é a literatura de cordel.

Registra alguns títulos como: “O homem que virou bode”, de Dila Soares; “O fantástico caso do padre que morreu 136 vezes e ressuscitou”, de Abraão Batista; “O rapaz que virou cachorro porque zombou do Padre Cícero”, de Jota Barros; “A moça que dançou com Satanás no inferno”, de José Costa Leite; “O cavalo que defecou dinheiro”, de José Martins de Athayde.

Phaelante enumera várias letras musicais que têm como foco a mentira, inclusive o próprio Gonzagão que, em parceria com Humberto Teixeira, gravou em 1949, a música “Lorota Boa”: Dei uma carreira num cabra/que mexeu com a Maroquinha/começou na Mata Grande/e acabou na Lagoinha/Corri mais de sete léguas/Carregado como eu vinha/Pois trazia na cabeça/Um balaio cheio de galinha.

Esses autores admitem ser muito complexo o mundo da mentira. Em suas nuancas existemaquelas que são justificadas, quando se mente para ser agradável, por mera educação. É o caso de alguém que afirma estar deliciosa a comida feita pela amada, quando estava simplesmente intragável. Ou, mesmo quando se utiliza a mentira para salvar a própria vida ou “tirar o pai da forca”, quer dizer, de uma trapalhada.

(Manoel Neto Teixeira, jornalista e historiador, membro da Academia de Letras de Garanhuns, é autor, dentre outras, da obra Pinto Ferreira – Vida e Obra)


O SILÊNCIO - Paulo Paiva

                 Não gosto de barulho. Sou contemplativo, preferindo olhar as pessoas e os acontecimentos. Sempre me sentei na última fila nos bancos escolares, e até hoje faço isso em qualquer platéia. De lá, observo o que se passa, e o que mais me fascina é a complexa natureza humana.

            Seguindo essa inclinação, sou avesso à velocidade e à pressa, procurando chegar aos compromissos antes do horário marcado, para não me estressar. Também tenho um ritmo próprio ao andar. Fazendo O Caminho de Santiago, notava que os peregrinos normalmente passavam por mim, e que o contrário era bem mais difícil de acontecer.

            Quando rapazola me colocava no lugar dos protagonistas dos livros que

lia. Até hoje tenho tendência a isso e, sem querer, caminho pelo outro lado da memória. Diz a Bíblia que Jesus nasceu dum médium silentium. Pensando sobre isso, constatei que tudo que é bom acontece na calmaria. Calados, descobrimos que estamos amando, e quando choramos, o pranto é mais sincero na quietude.

            Enquanto escrevo essas linhas, um garoto choraminga no quarto que foi de sua mãe. Mesmo desafinado, cantei Boi da Cara Preta para meu neto, o acalanto eterno que fez dormir todos nós.

Este simples ato me reconfortou, e me fez ver que nem tudo está perdido. É inverno, mas a primavera está vindo.

 

 Da SOBRAMES-PE (Sociedade Brasileira de Médicos Escritores)

DEUS É VERDADEIRO POETA, EU SOU O VENTRÍLOQUO DA MUSA. - José Aparecido Fiori


 







Realmente, o realejo envelheceu, não caiu de moda, se cair, vira souvenir. Na condição de ventríloquo da musa, prosélito da prosa, procurador da poesia, sirvo-me deste espaço para mostrar o que eu toco na velha lira que soluça nas vielas dos versos, na alameda do poema, na sarjeta da boemia.

Tenho por mim que a poesia é a ciência consciente up to date da mitologia. Pelo viés da imaginação o poeta canta seus mitos, o cientista joga dados com Deus. O cientista fala por dogmas e paradigmas, o poeta desvela, desmistifica, autentica, homologa o mito. O cientista materializa o espírito. O poeta espiritualiza a matéria. O poeta é platônico. O cientista é aristotélico. O poeta é plástico. O cientista é granítico. O poeta finge tão completamente, que chega a fingir a dor que deveras sente. O cientista finge tão completamente, que esfinge frugalmente. O poeta aprofunda o mistério do mito. O cientista desmistifica o fato. O poeta irradia o ser. O cientista radiologiza o não-ser. O cientista analisa. O poeta psicanalisa. O poeta é holístico. O cientista é sintético. O poeta enxerga o Um na multiplicidade. O cientista enxerga a multiplicidade no Um. O cientista é amigo do Rei. O poeta é amigo de Deus.

Poesia é um combate que aos fracos abate. É luta que luto. É coisa de louco alienado em anacoluto.

Nicho inócuo absoluto de inutensílios úteis, inutilidades fúteis.

Trova popular, beijos de batom no guardanapo, cachaça no bar, arrotos de tripas gástricas, riscos gráficos, rabiscos coronariográficos, barbarismos orais bárbaros, diarreias boçais, vômitos anais, quinquilharias venais, versos, verborréias, prosas de vodkas da Vó Tivica, cantadas da Gilda, chorinho da Maria do Cavaquinho, bafos de onça do Esmaga. Escritos adornados de adereços de lambrequim, tudo isso, nada disso, banalidades, maldades, nulidades, bosta navegando na ubiquidade.

Et verbum falicum factum est, o tesão em riste, a porra da palavra oral, verbal, os dentes afiados, a fome de viver, imortalizar, morrer.

E a lavra do poeta de lábia lânguido de libido se fez carne e habitou entre nós.

– Quem sou? – Poeta. Um emaranhado integrado tecido de células, sinapses, neurotransmissores, neons de átomos, eléctrons, nêutrons, prótons. Um quantum orgânico de plânctons. Um caranguejo que persevera percevejo. Uma ostra estressada encapsulando uma pedra sem valor até se amalgamar em pérola. Um hólon íntegro integrado do holograma.

Por falar em poesia, poesia, em grego, significa fazer, compor. Fazer poesia, todo mundo faz. É prosa que todo mundo faz poesia. A poesia, segundo eu, não precisa de rima para ser poesia. Poesia não precisa escrever no prefácio nem no epitáfio que é poesia.

A poesia in pectore não reciclável, não recitável, dá a impressão que não é, mas é poesia.

Há poesia na terra, no fogo, no ar, no mar, no bar.

Rimar é como o marketing de uma marca de cerveja que diz que desce redondo, porquanto a roda não é quadrada. Rimar é reiterar sons iguais, similares. Rimar é uniformizar vocábulos. Rimar é vocalizar analogias.

Agora, de púlpito ao público, a homilia final:

— Ouça do meu profundo abismo os grilos, os gritos, os lagartos, as cobras, todos os bichos. Entra sem bater, pode vir, a cama está arrumada, a geladeira cheia de cerveja, a pia impiedosamente limpa. Façamos amor, não façamos a guerra.

— Poesia é algo como um monólogo com o D’us. Sou  panteísta. Escravo da Poesia. Plagiador da Criação divina. Criança que engatinha nos versos e anti-versos. Só D’us é Poeta, o Senhor dos Poetas.

 

·         José Aparecido Fiori, jornalista de Curitiba, autor de Lolita de Curitiba , Acontecências e Textos para Ouvir.


Migalhas na toalha - Ánton Passaredo

 Morava em casa modesta. Dessas encontradas nos bairros mais afastados do centro “em Vila de Polaco” como diziam os moradores de áreas nobres de Curitiba. Sempre fora solteiro.

A casa de Petroski César Beszczynski era de madeira, com sala na parte da frente, dois quartos, um só banheiro e uma copa-cozinha com espaço generoso. Por ser a casa levantada do solo, em razão da umidade, dali da cozinha podia observar a parte de trás do terreno onde plantara há muito tempo uma alameda central de limoeiros. Assim fizera porque eles não cresciam muito e com isto podia ver a paisagem derramada abaixo do terreno situado numa pequena elevação. A vida de Petroski poderia ser resumida àquela copa-cozinha, onde havia o velho rádio herdado do seu avô e o relógio de parede de madeira escura. Nenhum retrato na parede havia. Era um solitário, com hábitos simples, repetidos diariamente.

Estava lavando a louça do café da manhã, somada a louça da janta do dia anterior, quando ouviu pequeno barulho próximo. Virou a cabeça, olhou por sobre o ombro, nada percebeu. O barulho parou de repente, mas logo aquele som voltou, após ele ter se concentrado na lavagem dos talheres. Novamente virou a cabeça e desta feita percebeu movimento sobre a mesa.

̶̶̶ ̶̶  Ei, o que é isto?

Para sua surpresa, pequenas galinhas  ̶̶ ̶  dúzia e meia, talvez duas dúzias  ̶ ̶  sobre a toalha, ciscando migalhas, "falando" uma linguagem que ele conseguia entender. Num instante uma delas dirigindo-se a Petroski, disse:

̶ ̶  Escuta, meu caro, você come pão de terceira, queijo de segunda e toma suco enlatado. Isto é muito ruim. Nós, galinhas de toalha, temos de nos submeter a comer essas migalhas. Vê se melhora sua refeição! Precisamos viver dias mais nutritivos.

̶ ̶  O quê que é isto!!!?  ̶ ̶  repetiu Petroski estarrecido. E emendou  ̶ ̶  Onde já se viu, galinhas cacarejarem uma fala dessas. O pior, intimando-me a mudar minha alimentação.

E a galinha líder continuou:

̶ ̶  Se você, Petroski, não mudar seus hábitos alimentares, preferimos permanecer como galinhas de toalhas dobradas, guardadas no tugúrio de gavetas. Preferimos a convivência de outras toalhas que também têm bichanos animados e divertidos, mesmo no escuro.

"Só me faltava esta. Ser repreendido por galinhas de toalha."

̶ ̶   Escuta aqui ô penosas! Vocês vão se catar! Eu deixava esta toalha direto sobre a mesa porque achava bonito o desenho de vocês nela. Quando deitadas vocês têm um colorido engraçadinho e juvenil. Mas diante desta intimidação, sabe o que vou fazer? Vou tocar fogo nesta toalha. Antes vou esmigalhar algumas de vocês.  ̶ ̶   E levantou o braço para dar uma porrada na mesa.

Foi então que as galinhas saltaram da mesa, saíram em disparada para a varanda, depois para o terreno, aproveitando que a porta da copa-cozinha estava aberta. Petroski, admirado, sentou-se na cadeira, ficou apreciando a correria das galinhas pelo terreiro. Mas rapidamente levantou-se, juntou as duas mãos ao lado da boca e gritou:

̶ ̶  Ei, Voltem! Voltem! Nada vai acontecer!

As galinhas então pararam a corrida, juntaram-se no meio do terreiro, entre a alameda de limoeiros e passando uma sobre as outras as suas asas formaram um círculo e a líder perguntou à assembleia  ̶  Então, voltamos ou não voltamos?

GRANDES VULTOS - Gregório de Matos - Jaqueline Salomé



 






 

Gregório de Matos, poeta de letra e estirpe, se tornou famoso no Brasil de todos os tempos. Vivendo em uma época conturbada, e de pouca poesia, destacou-se pelas suas manifestações satíricas. Desdenhou a Igreja e o Governo. Não ficou de fora a sociedade de Salvador, de então. É notória a sua habilidade nos versos e no domínio das mensagens conturbadoras.  Ficou em definitivo como representante maior da poesia socialista no Brasil. A sua história, como abaixo, testemunha esse gênio da Literatura Brasileira.     

 

 

Gregório de Matos Guerra nasceu em Salvador23 de dezembro de 1636. Faleceu em Recife26 de novembro de 1696Alcunhado de Boca do Inferno ou Boca de Brasa, foi advogado e poeta do Brasil colônia. É considerado um dos maiores poetas do barroco em Portugal e no Brasil e o mais importante poeta satírico da literatura em língua portuguesa no período colonial.

Um de seus mais antigos biógrafos foi Manuel Pereira Rabelo. Gregório de Matos é de uma família abastada, de empreiteiros de obras e funcionários administrativos (seu pai era português, natural de Guimarães). Assim como todos os brasileiros de então, sua nacionalidade era portuguesa, pois o Brasil só se tornaria independente no século XIX. Todos os cidadãos nascidos antes da independência eram luso-brasileiros.

Em 1642, estudou em Senador Canedo no Colégio dos Jesuítas, na Bahia. Continuou os seus estudos em Lisboa em 1650 e, em 1652, na Universidade de Coimbra, onde se formou em cânones, em 1661. Em 1663 foi nomeado juiz de fora de Alcácer do Sal, não sem antes atestar que era "puro de sangue", como determinavam as normas jurídicas da época.

Em 27 de janeiro de 1668, representou a Bahia nas Cortes de Lisboa. Em 1672 o Senado da Câmara da Bahia outorgou-lhe o cargo de procurador. A 20 de janeiro de 1674 foi novamente representante da Bahia nas cortes. Foi, contudo, destituído do cargo de procurador.

Voltou ao Brasil em 1679, nomeado pelo arcebispo Gaspar Barata de Mendonçadesembargador da Relação Eclesiástica da Bahia. Em 1682, D. Pedro II, rei de Portugal, nomeou Gregório de Matos como tesoureiro-mor da , um ano depois de ter tomado ordens menores. Em Portugal já ganhara a reputação de poeta satírico e improvisador.

Foi destituído dos cargos pelo novo arcebispo, frei João da Madre de Deus, por não querer usar batina nem aceitar a imposição das ordens maiores, de forma a estar apto para as funções a que tinha sido incumbido.

Começou então a satirizar os costumes do povo de todas as classes sociais baianas (a que chamará "canalha infernal") ou aos nobres (apelidados de "caramurus"). Desenvolve uma poesia corrosiva, erótica (quase ou mesmo pornográfica), apesar de também ter andado por caminhos mais líricos e mesmo sagrados.

Entre os seus amigos encontraremos, por exemplo, o poeta português Tomás Pinto Brandão.

Em 1685 o promotor eclesiástico da Bahia denunciou os seus costumes livres ao tribunal da inquisição. Ele foi acusado, por exemplo, de difamar Jesus Cristo e de não mostrar reverência, tirando o barrete da cabeça ao passar por uma procissão. A acusação não teve seguimento.

Entretanto, as inimizades cresceram em relação direta com os poemas que vai criando. Em 1694, acusado por vários lados (principalmente por parte do governador Antônio Luís Gonçalves da Câmara Coutinho) e correndo o risco de ser assassinado, é deportado para Angola. A condenação tida como mais leve é atribuída ao amigo e protetor D. João de Lencastre, então governador da Bahia. Dizem que Lencastre mantinha livro público no qual eram copiadas as poesias de Gregório.

Como recompensa por ter ajudado o governo local a combater uma conspiração militar, recebeu a permissão de voltar ao Brasil, ainda que sem permissão de voltar à Bahia. Morreu em Recife, vitimado por uma febre contraída em Angola.

 

Alcunha

alcunha boca do inferno foi dada a Gregório por sua ousadia em criticar a Igreja Católica, muitas vezes atacando padres e freiras. Criticava também a "cidade da Bahia", ou seja, Salvador, como neste soneto:

Tristes sucessos, casos lastimosos,

Desgraças nunca vistas, nem faladas.

São, ó Bahia, vésperas choradas

De outros que estão por vir estranhos

Sentimo-nos confusos e teimosos

Pois não damos remédios as já passadas,

Nem prevemos tampouco as esperadas

Como que estamos delas desejosos.

Levou-me o dinheiro, a má fortuna,

Ficamos sem tostão, real nem branca,

macutas, correão, nevelão, molhos:

Ninguém vê, ninguém fala, nem impugna,

E é que quem o dinheiro nos arranca,

Nos arrancam as mãos, a língua, os olhos.

Por tal motivo, entre outros citados na sua biografia, como sua poesia pornográfica, os quais fizeram de Gregório um poeta considerado "rebelde" que, apesar de ser um clássico, hoje ainda muitos consideram também um poeta maldito, ele se torna o primeiro poeta do Brasil que poderíamos, de certo modo, definir desta forma.

Obras

Em 1831, o historiador Francisco Adolfo de Varnhagen publicou 39 dos seus poemas na coletânea Florilégio da Poesia Brasileira (1850 em Lisboa).

Afrânio Peixoto edita a restante obra, de 1923 a 1933, em seis volumes a cargo da Academia Brasileira de Letras, reunidos nos códices existentes na Biblioteca Nacional e na Biblioteca Varnhagem, do Ministério das Relações Exteriores, exceto a parte pornográfica que aparecerá publicada, por fim, em 1968, por James Amado.