segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

O Natal

                                                                       


 Quando, finalmente, cheguei em casa, sentei e depois fechei a porta. Saí um pouco para olhar a noite, na verdade, a madrugada de Natal. Soprava um vento leste fraco e algo frio, desses do altiplano da Borborema, no verão. Perto, as luzes algo coloridas e importadas. Carros defronte as casas. Risadas altas podiam ser escutadas, um pouco de música, o chiar de um rojão fora de hora... Na avenida, bares fechados, poucas pessoas na via e alguns veículos. Olhei o céu e imaginei que, mesmo onde houvesse uma guerra, àquela hora seria de trégua. Assim, do vigia no convés do transatlântico que avança, ao monge na torre dos contrafortes do Himalaia, pensei haver Paz! Ouvi um bipe...e mais outro... Achei que o sinal repetido dos monitores e ventiladores da UTI vieram até os meus já mortificados ouvidos. Mortificados sim! De fato, habituados aos gritos de dor e ao choro, eles e meus também olhos, abertos por tantas noites, me trouxeram o som da pandemia. Soprou então um vento mais forte e quase gelado. Entrei e fechei a porta. Deixei a sala à meia-luz. Já no quarto, deitei e olhei para o teto, que encheu-se de fantasmas de outros Natais. Amigos, pacientes, parentes que partiram. Depois tudo foi ficando em harmonia. Não tive pressa na ave-maria. Lembrei que há estudados 2020 anos, Ele nasceu! Eu poderia até pintar a cena, se eu pintasse. Pensei, chega de imaginação por hora! Lembrei do último abraço da noite... dos meus pais velhinhos, dos meus irmãos distantes e quase falei baixo: parabéns Jesus! Estamos vivos, no Natal. Feliz Natal! 

Garanhuns-PE, 25 de dezembro de 2020, 02:30h. Ulisses Pereira ✍ Médico

quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

A sua árvore de natal - João Marques


  






A árvore de natal florescerá realmente, no futuro. Decorrerão tempos, para que isso aconteça. Enquanto o ódio e a perseguição pela inveja, o egoísmo pela posse, a falta de valorização da vida de todos prevalecerem, não florescerá. Contudo, essa árvore pode ser logo arrumada no interior de cada ser humano. A alma é capaz de comportar o artefato, de forma plena. Dos galhos, penderão desprendimentos pelo amor verdadeiro, folhas luminosas da conduta sábia e simples, cores da alegria pela existência. E, na noite de natal, essa árvore antecipada terá, de enfeite, os melhores pomos e presentes. E aí, de tanta felicidade, até as estrelas do céu se quedarão, para contemplar o brilho de cá, da festa. Feliz natal!

ENTÃO É NATAL NO ANO DE 2020 . O Natal, crianças, não é uma data. É um estado de espírito. Mary Ellen Chase







Caros amigos! Caras amigas! Quantas e quantas vezes vivemos essa data tão marcante? E o mais interessante é que em cada época teve um significado em nossa vida. Desde os longínquos natais na casa dos nossos avós, os parquinhos com brinquedos inocentes, como o carrossel, imagine empurrado a mão, com um sanfoneiro dando o ritmo da velocidade, a canoa, a “pequena” roda gigante, a pescaria, o passeio no centro da cidade e tantas coisas inesquecíveis, aos mais recentes, onde as estruturas são quase espaciais e a tecnologia fala mais alto que a imaginação das crianças. Ouso perguntar e responder: Qual o melhor? Não teve melhor nem pior, todos foram bons, com suas características, seus valores e os interesses de cada época.

Estamos nos preparando para um novo natal! Sem abraço, sem beijos, sem festas. Com restrições até nas atitudes. Até os nossos rostos terão que ser escondidos pelas máscaras e o cheiro predominante do champanhe será trocado pelo odor forte do álcool. Mas, em 2020 teremos natal sim! Mais distante, sem as viagens, nem as grandes festas familiares. Até as celebrações religiosas serão com menos gente. Outra coisa, não esqueçamos que, além da crise sanitária, há também uma financeira. Mas, temos que viver e fazer desse momento uma mudança de cobrança política, determinação por um tempo melhor e, acima de tudo, que esse vírus sirva para chegarmos nas comemorações com espírito melhor, homens com novos ideais e um coração muito mais puro.

Mas, somos humanos pensantes e inteligentes, devemos ver as coisas boas que aconteceram na história da humanidade, nesse ano de 2020. Vejamos algumas notícias que passaram despercebidas até pela grande mídia:

Durante o confinamento na Índia, milhares de tartarugas marinhas colocaram mais de 60 milhões de ovos, o que não acontecia há muito tempo. A própria natureza, percebendo que o homem deixou de intervir negativamente, reagiu de forma positiva.

Pandas que vivem em um zoológico de Hong Kong finalmente conseguiram acasalar depois de anos de tentativas frustradas.

Mais de 1 milhão de pessoas deixaram de fumar no Reino Unido. Vejam que foi só no Reino Unido. Pensando no futuro quanto a saúde do mundo vai ganhar.

As emissões de gás carbônico nunca foram tão baixas desde a 2ª Guerra Mundial. Melhorando, com isso, a qualidade do ar e do oxigênio na vida das pessoas e, também a saúde, diminuindo, principalmente, as doenças pulmonares.

Pela primeira vez na história da humanidade, cientistas do mundo inteiro estiveram focados em resolver um único problema. Homens e mulheres inteligentes passaram o ano com um único foco, independente do credo, cor ou raça. Nunca tantos se preocuparam com o bem da humanidade.

O veterano de guerra Tom Moore – de 99 anos, arrecadou mais de 22 milhões de dólares para o serviço nacional de saúde de seu país ao dar 100 voltas completas em seu jardim, mostrando que a idade não é impedimento para se tomar atitudes.

As pessoas nunca adotaram tantos animais de estimação como agora. Mais uma vez a integração da natureza com o humano. O respeito aos animais. Um ano que foi difícil conseguiu amolecer o coração dos homens em todos os sentidos.

Crianças do mundo inteiro colocaram imagens de arco-íris em suas janelas com a mensagem: “Após a tempestade, vem o arco-íris”. A pandemia atingiu, em todos os sentidos, todas as idades. A humanidade se preocupou com o planeta e com o próximo. As crianças foram envolvidas nesse processo de fazer um mundo melhor.

E como não poderia deixar de ser, a educação mudou rapidamente, professores e alunos se adaptaram às mudanças e colocaram em prática um novo ensino. Os computadores anteciparam a sua participação na vida educacional de todos. E assim, o novo normal teve na educação o seu principal elemento de transformação, para viver esse momento nunca esperado.

Então, meus caros leitores, teremos sim um natal em 2020! E não vamos pensar só na grande tristeza de tantas perdas de perto e de longe. Sofremos, mas aprendemos. Perdemos, mas ganhamos na aprendizagem e na humanização do ser vivo, na luta harmônica para vencer um vírus mortal e desconhecido. E sairemos mais fortes e esperançosos para recebermos 2021. Que ele traga força, amor, esperança e que tenhamos coragem de repetir a frase milenar: FELIZ NATAL!

Prof. Albérico Luiz Fernandes Vilela

Membro da Academia Pernambucana de Educadores

Membro da União Brasileira de Escritores

Membro do Lions Club Internacional

Diretor Pedagógico da UNIC – Universidade da Criança

Palestrante da Área de Educação

 prof.alberico@gmail.com

quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

A TECELÃ DO COSMOS Tonicato Miranda para Malita Miranda


 






Salve mãe das águas, da terra e do céu

Você tece bondade como a abelha faz o mel

Teça o siso nos homens, o riso nas crianças

Com a agulha ponteia todos com paciências

Emenda a amargura dos humanos entre nós

Vá tecendo o silêncio com pitadas de canto e voz

Mas não se esqueça de desenhar no tricô, o farol

Mostra a fúria das águas quebrando no atol

O vento desmancha a ousadia dos homens

Tudo vira água, a subir como vapor às nuvens

Você sabe disto, e  sabe ainda muito mais

Fiandeira experiente confia nos animais

Porque sabe controlar toda a destemperança

Alimentar a humanidade de verde-esperança

Mas se faltar a lã do novelo, continua a tecer

Teça pensamentos calados, nada é pra esquecer

Eles passarão de uma cabeça a outra cabeça

E aquela com outra agulha fará tudo renascer

Terá sido criado o dom do cosmos, não do diabo

E tecido o manto do universo, tudo estará criado


Sobre mães e tarrafas

para a mãe Malita

você, eterna figurinha

do meu álbum de vida

uma velhinha só minha

é meu vinho, a bebida

quanto mais envelhece

melhor fica na garrafa

melhor comigo parece

é o barco, minha tarrafa

onde lançar, peixe virá

às vezes virão surpresas

latas, cordas e um colar

alegrias em contas presas

tudo a nos fazer mais amar

na doçura da boa receita

um doce de coco e manjar

comida sempre bem feita

a nos servir como marajás

o que dizer do tricô e os fios

nos sapatinhos de lã grossa

protegendo os pés dos frios

aquecedor que nos enrosca

ah! malita, jogue sua tarrafa

me aprisiona, me envolva

reza uma oração à Fátima

a grande distância dissolva



Síndrome de Down Estratégias e atividades para ajudar na aprendizagem - Ana Carla Santos - Garanhuns


 






A síndrome de Down ou trissomia do cromossomo 21 é uma condição genética que leva a características físicas singulares e predisposição a algumas doenças. Ela é causada por um cromossomo extra no par  21.

As crianças com SD podem ter atraso no desenvolvimento, dificuldade de aprendizagem, atraso de fala, aumento de peso, deficiência intelectual ou dificuldade em pensar e compreender.

Embora apresentem deficiências intelectuais e de aprendizado, pessoas com síndrome de Down têm personalidade única, estabelecem boa comunicação. Quanto maior o estímulo dado a essas crianças durante a infância, menor o grau de presença dos sintomas.

O suporte oferecido para as crianças com SD deve ser pensado de forma individualizada, ou seja, de acordo com o perfil e dificuldades comportamentais e cognitivas de cada criança. 

Estratégias e atividades para ajudar na aprendizagem da criança:

·         Adaptar o conteúdo ao nível de conhecimento da criança;

·         Usar linguagem simples e clara;

·         Usar gestos e imagens para facilitar a compreensão;

·         Leitura, manuseio de álbuns, contação de histórias, atividades relacionadas a música,  jogos e brincadeiras em família são muito proveitosas;

·         Aproveitar as capacidades atuais da criança, preparando-a assim para atingir atividades mais complexas. As atividades motoras serão indispensáveis;

·         Oferecer atividades para o fortalecimento do pulso e dedos, como por exemplo: alinhavar, seguir tracinhos com o lápis, desenhar, separar, cortar, apertar, construir, etc;

·         Trabalhar a escrita das letras em um tamanho maior;

·         Usar lápis mais grossos ou adaptadores “apoio para os dedos”;

·         Usar um grande leque de atividades e materiais multissensoriais.

A equipe multidisciplinar é muito importante para o desenvolvimento da criança.

Ana Carla Santos

Psicopedagoga – CRPp sindical: 523

Neuropsicopedagoga

Seus cachorros! William Santiago







Voltar pra casa tarde da noite. Se fosse de tardinha, teria visto as cores do outono impressas nas árvores. As mil cores, os meios-tons do outono. À noite não. As ruas são bem iluminadas, mas as sombras são sempre sombras. Assovio pra esquentar o corpo e espanar o medo que, em tais momentos, costuma subir à espinha que nem poeira.

As sombras são sempre sombras. No caminho de casa, todas as casas têm cachorros e há sombras enormes, cachorros enormes, sombras e cachorros amedrontadores. Voltar pra casa à noite dá uma bambeza que começa, acho, nos cotovelos e se esparrama pelo corpo todo, até bater lá no coração. Gelo. Gelo de medo dos gigantes que vou enfrentar nessa rua estreitinha e pequena que é a mais comprida rua do mundo. Como se eu fosse o buscador do velo de ouro e eles os guardiões apaixonados, nascem cachorros de cada portão da rua, brotam sentinelas de cada jardim. Não gostam de mim ou pressentem que tenho medo. Emito vibrações, lá isso é verdade. Ou será porque sou estrangeiro? Cabelo escuro, aspecto subdesenvolvido. Talvez seja isso que os açule contra mim.

Daquele portão, por exemplo, há de surgir o grande dobermann que, irado, há de rosnar, à medida que me aproximo. Barulhos nas moitas. São eles. Desta vez se uniram, vão atacar em grupo, distribuídos, legionários. Não, ainda não. São maçãs que caem das sombras. Maçãs se perdendo, folhas secando, o vento magoando os olhos. O cão policial e o gigantesco dobermann não gostam de mim, não há como duvidar.

Mas eu os mato. Ah, se mato! Não fiz nada, fiz? Só porque passo na porta deles? Só porque sou estrangeiro? Vou matá-los em legítima defesa. As maçãs apodrecidas serão as minhas testemunhas. Vou matá-los. Quando me atacarem, sei que vou gelar, mas vou vencer o gelo. Hei de brigar dentro de mim mesmo pra vencer o medo, antes mesmo de brigar contra os dois leões. Eu os espero, mato os dois. Se tivesse um revólver atirava com gosto na goela deles, quando escancarassem as mandíbulas para me estraçalhar, aquele rosnado grosso me fazendo tremer as pernas.

 Atiro na goela, que é pra sair pelo rabo, cortando tudo, rasgando tudo, quero ver o sangue jorrando que nem petróleo, jorrando longe, esguichando pra todos os lados, quero gozar cada um dos uivos de dor. Eu os mato. Se não tiver revólver, vai de faca mesmo. Uma faca pontuda, punhal será, furando o pescoço de cima pra baixo, entrando de jeito a ficar cravado na boca, um poste espetado, nascendo de debaixo da língua. Espetado, com força.

Mato, mato sim. Sem remorso, sem dor de consciência. E mato até o dono, se ainda tiver coragem de reclamar. E, no meu desatino, sou capaz de matar até aquelas senhoras alvas, as velhinhas bondosas da Sociedade Protetora dos Animais. Ninguém tem o direito de me passar medo, ninguém mesmo. Mesmo que esses cães não ataquem, mesmo que sejam inofensivos, mandem esses bichos calarem a boca, escondam essas feras quando eu passo. Cachorros filhos duma égua! Seus donos pensam que mandam no mundo, que podem me passar medo? Só porque são gordos e bem nutridos e têm casas bonitas?

Escondam esses bichos, entupam a boca desses bichos ou aguentem as consequências. Não reconheço seu direito de me assustarem com seus cachorros de merda. Pra vocês, aqui meu elogio, meu cala-boca, minha adulação: está na ponta da faca ou no cano do revólver. É só escolher, é só dizer!

Série Copenhague Zero  Grau
Copenhague, Dinamarca/out/1979-
(publicado no jornal Município de Pitangui, em 28/09/1980)

William Santiago

Velhos tempos... Belos dias... Luiz Gonzaga de Mattos


 







Mexendo numa mala cheia de fotos antigas, lembranças de momentos da minha família, encontrei um convite amarelecido pelo tempo. Certamente dos distantes anos do início da década de 60. Era o convite para um baile no pequeno clube da cidade de Sengés, no interior do Paraná. Assim, como num tapete voador das histórias das Mil e Uma e Noites, viajei no tempo. Para animar meus devaneios liguei o som, com The Platters cantando Only you... e me senti dançando pelo pequeno salão do Olímpico.

Tardes de carnavais, das brincadeiras dançantes, dos bailes no Olímpico.
Do Olímpico que também dava bailes no velho campo ao lado do então Grupo Escolar.
Saudade do nosso Esporte Clube Olímpico, o ECO. Da camisa verde e amarela.
Das disputas com o Operário. Clubes vizinhos na mesma quadra. Separados apenas pelo ardor das disputas esportivas nos festivais reunindo os times do Miolo, Miolinho, Ouro Verde... E depois o churrasco sob os eucaliptos.
Tempos de um clube social e esportivo que marcou época em nossa região. Pelos seus bailes, pelo seu time. Um clube que recebia, em sua sede, as lideranças políticas nas convenções dos diretórios partidários. Que estava nas agendas dos estudantes com as solenidades de colação de grau. E que foi cenário de tantos romances. O clube de nossa juventude de tantas gerações.
Hoje, certamente, todos pensam com saudade de nosso Olímpico e lembram-se das
Jovens tardes de domingo
Tantas alegrias
Velhos tempos
Belos dias

 

Luiz Gonzaga de Mattos


JOSÉ BRASILEIREO VILANOVA E A LITERATURA NO BRASIL COLONIAL (III) - Manoel Neto Teixeira


 








O escritor e filólogo pernambucano José Brasileiro Vilanova, na sua obra A Literatura no Brasil Colonial, editora Universitária (UFPE), edição 1977, informa que do ponto de vista literário o século XVIII apresenta duas fases distintas: na primeira, predomina o academicismo inspirado no mecenatismo oficial português; na segunda, prevalece a reação neoclássica, de oposição ao barroquismo, representada principalmente pelos poetas do chamado “Grupo Mineiro”.

Mais da metade desse século caracteriza-se pelo prolongamento do espírito barroco e encontra nas Academias Literárias sua legítima forma de expressão. Pouco importa que elas tenham tido existência efêmera. Reunia intelectuais dissociados por atividades profissionais diferentes, orientando as pesquisas históricas e incentivando as produções poéticas, que evidenciam o espírito literário ainda do Brasil colonial.

Diz a mesma fonte que as composições em versos não vão além dos jogos de palavras, quase sempre artificiais ditadas sobretudo pelo desejo de vanglória e bajulação, principalmente relacionadas com figuras do status quo. Coube aos trabalhos, nascidos do academicismo, a ampliação desses limites, abarcando a vida política, religiosa, militar, genealógica e literária da Colônia.

“A partir da publicação das Obras Poéticas de Cláudio Manuel da Costa, em 1768 – diz Brasileiro Vilanova - e da fundação da Arcádia Ultramarina, é manifesta a reação neoclássica, tentativa de volta às fontes mais puras do classicismo. Adota-se, então, nova concepção estética, em que a simplicidade e a espontaneidade são elementos dominantes. Por isto mesmo - acrescenta - a vida e os seus problemas já não se prestam para divagações sutis da inteligência. Também a observação da realidade já não será usada como elemento capaz de impressionar os sentidos ou despertar imagens sensoriais. Procura-se, ao contrário, integrar o homem na natureza, possibilitando sua identificação com o meio em que vive e as coisas que o cercam”.

O retorno da literatura às fontes primitivas do classicismo explica a preferência pela poesia épica, satírica e pelo lirismo, não raro, de sentido moralizante, praticados no Brasil na segunda metade do século XVIII, acrescenta a mesma fonte.

Chega o tempo das Academias Literárias, já existentes em países europeus, desde o século XV. Em Portugal, surgiriam a partir do século XVII, destacando-se a dos Singulares, a dos Generosos e a dos Anônimos. No Brasil colonial, somente vão aparecer a partir do século XVIII, e tinham caráter oficial e eram de caráter metropolitano. Despertariam o interesse pelos estudos históricos, literários e dos problemas sociais.

A primeira Academia Literária foi fundada na Bahia, em 1724, e recebeu a denominação de Academia Brasileira dos Esquecidos. Seu fundador foi o vice-rei Vasco Fernandes de Menezes, o qual, “para dar a conhecer os talentos que nesta província floresceu, e por falta de exercícios literários, estavam como desconhecidos, determinou instituir uma academia. Durou apenas um ano e teve como principais sócios e fundadores e coronel Sebastião da Rocha Pita, o padre Gonçalo Soares da França, o dr. Inácio Figueiredo e Luiz de Siqueira da Gama. Essa academia chega a planejar o estudo da história do Brasil em quatro partes: natural, militar, eclesiástica e política.

A segunda academia teria surgido no Rio de Janeiro, em 1736, sob a denominação de Felizes, que funcionaria até 1740. Compunha-se de trinta sócios. Também sediada no Rio de Janeiro foi a Academia dos Seletos, em 1752, com o objetivo expresso de homenagear Gomes Freire de Andrade, nomeado para o cargo de Comissário e Árbitro Superintendente da Demarcação das Fronteiras do Sul. Teve como presidente o jesuíta Francisco de Faria e era secretariada por Manuel Tavares de Siqueira e Sá.

Outra entidade do gênero viria a ser criada na Bahia, em 1759, a Academia Brasílica dos Acadêmicos Renascidos, iniciativa de José Mascarenhas Pacheco Pereira de Melo. Sua organização tinha como modelo a Academia Real da História Portuguesa. Era constituída por quarenta sócios.

HISTORIOGRAFIA

As pesquisas histórias constituíam o principal objetivo das academias literárias baianas. Desde os primeiros tempos, aliás, consoante prova a contribuição dos jesuítas e dos cronistas, sempre houve no Brasil interesse pelas observações históricas. No século XVIII, mesmo antes de serem criadas as associações literárias, não diminuía a curiosidade pelos assuntos sobre história, diz Brasileiro Vilanova.

 A Academia dos Esquecidos teve como principal expoente o historiador Sebastião da Rocha Pinta, único a deixar obra impressa versando sobre Uma história da América Portuguesa, desde o seu descobrimento até o ano de 1724. E o fez, “em decadente estilo barroco”, segundo a crítica. Outro destaque para a Academia dos Renascidos, que teria influenciado os historiadores do século XVIII, cujas principais publicações foram: Dissertação sobre a história eclesiástica do Brasil, de Gonçalo Soares da França; A história militar do Brasil, de José Mirales; Desagravos do Brasil e glórias de Pernambuco, de Benedito Domingos de Loreto, na qual descreve pormenorizadamente a história da capitania de Pernambuco.

Outro destaque para a obra do pernambucano Frei Antônio de Santa Maria Jaboatão, com os títulos: Novo orbe seráfico brasílico ou crônica dos frades menores da província do Brasil. Autor ainda de um Catálogo genealógico, o frade franciscano não se limitou a escrever a história dos seus companheiros de Ordem, mas incluiu no seu livro, em estilo agradável, segundo a crítica, interessantes observações sobre a vida colonial, sem esquecer informações locais, lendas e tradições populares.

Descendente de bandeirantes, Pedro Taques de Almeida Pais Leme é considerado o primeiro genealogista brasileiro, autor de importante obra nesse campo do conhecimento: Nobiliarquia paulistana, história da capitania de São Vicente; Informações sobre as minas de São Paulo; e Notícias históricas da expulsão dos jesuítas de São Paulo. Produziu ainda Nobiliarquia paulistana, em que descreve as principais famílias paulistas e os mais notáveis feitos dos bandeirantes.

Outra obra que mereceu destaque, sob o título de Memórias para a história da capitania de São Vicente, do frei Gaspar da Madre de Deus, publicada em 1797, adotando métodos objetivos e positivos, segundo a crítica. Também, nessa mesma linha, resgistra-se a obra Cultura e opulência do Brasil, de André João Andreoni (Lisboa – 1791), versando sobre as minas existentes na Colônia, do processo de fabricação do açúcar, do plantio e beneficiamento do fumo. Fornece ainda informações sobre os emolumentos dados pelo Brasil a Portugal. A primeira edição de Cultura e opulência do Brasil foi sequestrada por ordem de D. João-V, sob a alegação de que o livro divulgava todos os segredos da Colônia brasileira aos estrangeiros.

POESIA LÍRICA

Houve nesse período uma abundante produção de poesia lírica, na segunda metade do século XVIII, porém, sem expressão literária, conforme a crítica. A grande preocupação estava voltada para a rima, em prejuízo de outros recursos e técnicas literárias. Exceção para a obra: Peregrino da américa, de Nuno Marques Pereira. A obra, dedicada ao mestre de campo Manuel Nunes Viana, famoso chefe dos emboabas, foi publicada em 1728 e já em 1730 merecia uma segunda edição. Houve quem visse nessa obra o primeiro romance nacional.

Afirma José Brasileiro Vilanova que os versos concebidos em toda a primeira metade do século XVIII não possuem expressão artística nem valor literário. O soneto de Antônio Antunes de Menezes, dedicado a Gomes Freire de Andrade, é uma prova desse estágio:

Vossa espera, senhor, se inculca deste

Que parece exceder de Polo, a Polo

Na cabeça se observa o mesmo Apolo,

Neste peito se admira o mesmo Marte.

            Três fatos principais distinguem, na segunda metade do século XVIII, a vida literária no Brasil. Um deles é a influência do enciclopedismo francês, através das duas sociedades culturais fundadas no Rio de Janeiro: a Academia Científica e a Sociedade Literária, as quais, na realidade, reuniam mais cientistas do que literatos, conforme os registros. Instalada sob a proteção do Marquês do Lavradio, em 1772, dedicou-se aos estudos da medicina, física, química, história natural e agricultura.

            Refere-se também José Brasileiro Vilanova ao arcadismo que teria sido iniciado por Claudio Manuel da Costa, com grande influência nesse período. Ele escreveu sonetos, epicédios, epístolas e fábulas em que se admira sobretudo a perfeição formal. Árcade na linguagem, temática e na técnica. “De todos os representantes do chamado Grupo Mineiro, Tomás Antônio Gonzaga foi “o mavioso Dirceu, o maior lírico”. Suas obras completas foram editadas pelo Instituto Nacional do Livro.

             A epopeia é a narração, em versos, de atos heroicos, de caráter real ou imaginário. “Depois do sucesso obtido pelos clássicos europeus, e da repercussão de Os Lusíadas, em Portugal, os autores brasileiros, sempre sôfregos em imitar os literatos portugueses, não poderiam deixar de explorar o aspecto épico da poesia. Assim, houve manifestações típicas na Colônia, devendo ser assinalados Basílio da Gama, com o Uruguai; Durão, com o Caramuru; e Claudio Manuel da Costa, com Vila Rica”.

            “Caramuru – diz Brasileiro Vilanova - é um poema heroico em dez cantos de oitava rima e versos decassílabos, no qual, os episódios mais importantes, significativos, são demasiadamente extensos, em face da imitação camoniana”.

            Enquanto o Desertor das Letras, de Silva Alvarenga, poema heroico-cômico, teve o objetivo de elogiar a reforma universitária pombalina, as Cartas Chilenas, de   Gonzaga, inauguram a sátira política brasileira. Foram publicadas, pela primeira vez, em número de sete, na revista “Minerva Brasiliense”, em 1845.

            POESIA POPULAR

            Finalmente, não poderia faltar o braço da poesia popular brasileira, com Domingos Caldas Barbosa, autor de cantigas, modinhas, cantatas etc., colecionadas com o título de Viola de Lereno. Foi poeta popular, improvisador ao som da viola, com temáticas brasileiras onde não faltava o sensualismo amoroso. Os versos de Caldas Barbosa foram publicados em Lisboa e, 1798.

            Nos comentários finais de sua obra, José Brasileiro Vilanova diz: “É costume citar alguns nomes de autores, nos fins do século XVIII, contando-se entre eles o dicionarista Morais, Matias Aires e Teresa Margarida, considerada a primeira romancista brasileira. De importância real, deve ser feita referência a Antônio Morais e Silva, que foi o primeiro brasileiro a sistematizar um Dicionário da Língua Portuguesa. O livro tem dois volumes e sua publicação verificou-se em Lisboa, em 1789. É um verdadeiro documento da língua nacional no século XVIII. Em 1922, comemorativo do primeiro centenário da Independência do Brasil, foi divulgada edição fac-similar dessa obra”.

                        (Manoel Neto Teixeira é autor, dentre outras, da obra Garanhuns, Álbum do Novo Milênio (1811-2016, e membro da Academia Pernambucana de Letras Jurídicas).

E-mail: polysneto@yahoo.com.br