segunda-feira, 30 de agosto de 2021

COMPLEXO DE BRUGUELOS - Ivan Rodrigues

 








Todos sabem e, às vezes por experiência própria, conhecem bem a vida dos filhotes de passarinho.  Enquanto não alçam voo próprio, permanecem amontoados no ninho à espera da ave-mãe para se alimentarem e, por consequência, sobreviverem. A rotina é exasperante com os bruguelos ansiosos, bicos abertos voltados para o céu, à espera da provedora que lhes trará o alimento salvador que ela, previdente, trará em suas próprias entranhas e o regurgitará diretamente no bico do filhote faminto. Impassíveis, nada fazem a não ser o piado insistente e lamurioso. E triste é a fatalidade que muitas vezes acontece pela morte, acidente ou prisão da ave-mãe que, dessa forma, fica impedida de socorrer os filhotes carentes, e disso resultando a morte inevitável dos desvalidos dependentes.

Quando reflito sobre a desdita dos filhotes que sucumbem por uma espera frustrada da ave-mãe, é inevitável estabelecer-se um paralelo com a nossa querida Garanhuns, sempre à  eterna e passiva espera dos benefícios carreados pelos incertos benfeitores, sem que suas próprias lideranças promovam e criem iniciativas imprescindíveis para a alavancagem do seu desenvolvimento.

Não assumimos ações propositivas; não planejamos; não concebemos projetos; não discutimos ações; não debatemos alternativas; não buscamos novas formas de produção; não garimpamos parcerias; não fomos capazes, sequer, de provocar um investimento do Governo Federal no comando de um conterrâneo durante oito anos; e quando o Município perde posição, ficamos reclamando dos outros por não terem cumprido um papel que era de nossa responsabilidade.

Até hoje não conseguimos, sequer, identificar a vocação de desenvolvimento para nossa terra, limitando-nos a uma crítica não fundamentada sobre a ausência de indústrias, esquecendo as mal sucedidas experiências anteriores. Será que nossas lideranças ainda acreditam que empresas virão instalar-se em Garanhuns, sem que tenham assegurado apoio institucional e condições favoráveis de mercado consumidor, logística de distribuição, matéria prima e mão de obra qualificada? Será que os exemplos exitosos não foram suficientes para alargar a cabeça dos nossas lideranças?

Eduardo Campos entendia que a vocação de Garanhuns seria dirigida para os polos de turismo e educacional e eu exemplifico: os maiores sucessos nessa área que não foram trazidos de fora, mas sim criados pela iniciativa de nossas lideranças: na área cultural, como força geradora, o passo inicial promovido por Souto Dourado em 1968/72, através da criação do Centro Cultural de Garanhuns; na área universitária que abriga hoje centenas de professores, doutores e milhares de alunos, a genetriz foi a inspiração de Amílcar Valença com a fundação da Faculdade de Administração de Garanhuns, em 1977, que gerou a AESGA; na área turística, a criação do Festival de Inverno por iniciativa de Ivo Amaral que ganhou força e  situa-se atualmente como um dos maiores festivais do  Brasil.

Sou do tempo em que Garanhuns disputava com Caruarú a primazia entre os municípios do Estado e era um páreo duro! Era um grande centro educacional, com três colégios centenários que atraiam estudantes do Ceará a Alagoas.  Inaugurou a primeira Rádio Emissora do interior, com alta qualidade técnica e cultural, incorporada à Rede Jornal do Comércio, com sua pouco modesta afirmação de “Pernambuco Falando Para o Mundo”. Primeiro Bispado do interior, somente muitos anos depois seguido por Caruarú, Palmares, Nazaré da Mata, Pesqueira e Afogados da Ingazeira.

O Terminal Ferroviário mais importante do interior do Estado da Great Western of Brazil Railway Co. (GWBR) desde 1887, assegurando expressiva distribuição e coleta de mercadorias na grande região do Agreste. Cinco grandes usinas de compra, beneficiamento, distribuição e exportação de cereais: Manoel Pedro da Cunha, Schenker Barbosa, Pinto Alves e as multi nacionais Sanbra e Anderson Clayton. As montanhas de fardos de algodão, sacos de café, feijão, milho e mamona extravasavam dos armazéns ocupando até as calçadas das usinas. Inúmeras fazendas produzindo café fino, tipo exportação, que era exibido nas vitrinas da Europa, com a recomendação e o rótulo de “Café de Garanhuns”.

Uma vida cultural intensa com publicação e edição de livros, revistas e jornais, alcançando o feito extraordinário de possuir um jornal diário em circulação, o “Garanhuns Diário”, fruto do pioneirismo do grande Dario Rego. Um grupo teatral amador, o “Grêmio Polymáthico de Garanhuns”, constituído por notáveis artistas amadores e com frequentes programações. Duas instituições expressivas para formação de menores carentes: a Fazenda Santa Rosa e o Abrigo Bom Pastor, que atraíam adolescentes de todo o Estado.

Até quando surgem as reclamações, elas são fora de foco. Quando acontece um acidente no sistema de bombeamento ou na adutora que acarreta deficiência temporária do abastecimento dagua, com toda razão é natural que surjam as reclamações, mas de pronto exacerbadas pelo exagero de acusar os governos por inoperância, esquecendo que foi o Governo de Eduardo Campos que, com dois anos e quatro meses de mandato, arrancou Garanhuns de um RACIONAMENTO DE TRINTA ANOS e ignorando que, mesmo no auge da seca que vem assolando o Estado, nossa cidade foi uma das pouquíssimas que mantiveram abastecimento dágua durante 24 horas.

Em contraponto e para certificar o que afirmo, somos relapsos para fazer a parte que nos toca: no Governo de Arraes foi construída a barragem da Cajarana e no Governo de Eduardo Campos foi implantada a adutora para abastecimento de São Pedro, tornando a vila independente do ramal da cidade. Felicidade completa, mas ninguém foi às ruas para protestar quando os predatórios tomateiros de Camocim, com suas plantações a montante da barragem, poluíram a barragem com agro-tóxicos e a SECARAM TOTALMENTE, deixando a vila sem abastecimento, sendo necessário restabelecer o ramal desativado da cidade. Está lá para quem quiser ver! E ainda surgiram lideranças políticas irresponsáveis que na época preparavam Festivais do Tomate.... com todas as pompas e foguetórios! E ainda bem que a barragem secou antes de começar a mortandade de gente intoxicada!

Recentemente, extinguiu-se um festival bem sucedido e já consolidado em oito edições, como comprovam as informações oficiais da edilidade, decisão que resultou em significativos prejuízos para o Município (do hoteleiro ao pipoqueiro, até aos cofres municipais) e, nem por força do prejuízo individual esboçou-se a menor reação. Não fora a manifestação individual de milhares de pessoas através das redes sociais e tudo correria sob o olhar tolerante da sociedade organizada.

Atualmente, ao invés de disputar a primazia, Garanhuns desespera-se na luta para não sair da lista dos dez maiores municípios do Estado, uma vez que já foi ultrapassado por Vitória de Sto. Antão, Ipojuca, Cabo, Olinda, Jaboatão, Paulista, Caruarú, Petrolina e temos no nosso encalço Goiana, Igarassú, Gravatá e Serra Talhada. Continuamos, entretanto, com os bicos abertos voltados para o ar, esperando que alguma fada madrinha venha nos socorrer. Aceitamos ser coadjuvantes, sem assumir o protagonismo que seria de nossa obrigação. Quando é que vamos entender que o dever e a iniciativa são nossas e não dos outros?

Essa ideia entrou em minhas reflexões, comparando-a com a passividade de Garanhuns diante dos malefícios que se cometem, constantemente, para seu prejuízo, sem que se levante uma reação da sociedade organizada (desorganizada?) da nossa terra. Nem quando arrostam prejuízos irreparáveis em suas próprias atividades, tomam qualquer iniciativa para reverter os procedimentos daninhos. Os exemplos são costumeiros, aberrantes, em sucessão enfadonha, sem que se levante uma voz ou mobilização, sequer, de reação, protesto ou revolta. Manifesta-se somente num enfadonho “piado de bruguelos famintos”, lamuriento e sem fim do QUE JÁ ERA e do QUE ACABOU...e o lamento pela ausência da ave-mãe que nunca chega com a comida!


EMOCIONANTE, Ivan e Família Rodrigues tombam casa na tradicional Praça Souto Filho em Garanhuns - Ivan Rodrigues

  (O texto é de minha autoria, mas a manchete e as fotos são por conta da generosidade do meu amigo, Ronaldo César, excelente blogueiro e comunicador de minha terra.)



PRAÇA SOUTO FILHO Nº 71 - GARANHUNS

 

No dia do nosso casamento, em 07/07/1949, ao terminar a cerimônia, fomos morar neste endereço, na cidade de Garanhuns – eu e Dulce!

 

A praça era apenas um arremedo, tinha apenas três casas e a rua não era, sequer, calçada. Vizinhos, de um lado, o Prof. Uzzae Canuto, na casa que pertencera ao Reverendo William Thompson, que considero “o mais garanhuense dos missionários americanos que aqui aportaram”, e do outro, o meu querido primo e compadre Zito Branco.

 

Do outro lado da rua, o longo muro que cercava o Colégio 15 de Novembro e – à esquerda – a sede bonita do Sport Clube de Garanhuns, hoje desfigurada.



A casinha ainda está lá fincada e continua a oferecer a mesma paisagem: Casa simples, pequena, murinho baixo vasado por uma grade de ferro bem fininha que não perturba a visão da paisagem que oferece; o ineditismo de um inusitado juazeiro junto às flores do jardim em frente da casa; um quintal grande com pitangas, acerolas, abacates, bananas, goiabas, carambolas, seriguelas, (objetos de cobiça de um bando de perambulantes saguins que não dão sossego), e - para garantir boas saladas - nunca faltam couves, coentros, salsas, espinafres, e vai por aí afora.

 

Até a conta de luz emitida pela Celpe traz, em seus detalhes, um endereço inconfundível e de autor desconhecido (juro que não fui eu ...): “Praça Souto Filho, 71. Em frente à Fonte Luminosa” !. Usei a Fonte, durante muitos anos, para criar um belo repuxo artificial de “NEVE”, adicionando às suas águas belos pacotes de sabão em pó cheiroso, que lhe dava novas características e proporcionava belas fotografias – ostentando a “neve de Garanhuns” - aos turistas que aqui aportavam durante o ano inteiro.

 

Grupos de rapazes e moças que, curiosamente, paravam em frente para admirar a casa com todas as portas e janelas escancaradas, e de forma curiosa, surpreendidos com as prateleiras da parede fronteiriça da sala, entulhada de livros, que davam à casa uma impressão de algum órgão cartorário, puxavam e curtiam uma boa conversa, sentavam no terraço comigo, bebiam meu vinho e só saíam tarde da noite.



     Ivan e D. Dulce na comemoração dos 60 anos de casamento


A minha longa vida profissional obrigou-me a uma segunda residência no Recife, mas nunca me afastei dessa “casinha” charmosa, simpática e fascinante, em que criei filhos e netos, alguns ali nasceram, inclusive sobrinhos e, mesmo sem que se apercebesse, criou-se uma verdadeira mística na família em torno de sua existência. 

 

Parece existir um certo fascínio, uma sedução e uma aura que a circunda e atrai a atenção das pessoas que por lá transitam. Não é referência de fatos históricos, não possui qualquer componente invulgar, nunca foi palco de atrações retumbantes nem ocorrências excepcionais. É apenas uma casa como as outras...


                                                                  Muro baixinho e sem arranjos de proteção



A última pintura nela realizada conjugou uma variedade de cores surpreendente que lhe emprestou uma imagem (na opinião da família) que atrai a admiração de quem passa, dos estudantes que frequentam regularmente a praça e até dos turistas que aqui aportam durante o ano inteiro.

 

Levei muito tempo, procurando entender os motivos dessa atração que contaminava, inclusive, os estranhos que passavam por ela e no que diz respeito à família, é impressionante o apego, o carinho e a afeição que todos dedicam à modesta casa.

 

Meu filho falecido, José Ivan, foi procurado certa vez por um seu amigo que lhe interpelou: “Zé Ivan, Dr. Ivan não vende aquela casa da Praça Souto Filho, não?”, ao que meu filho respondeu de pronto: “Dr. Ivan não tem casa, não ! Aquela casa é da família e não se vende, não se aluga, nem se troca!”.



  Zé Ivan  (falecido)

Noutra ocasião, uma moça bateu na porta e quando atendida por Dulce, foi logo perguntando se ela era a dona da casa. Com a confirmação, ela pediu para que a casa lhe fosse mostrada, pois era apaixonada por ela e não cansava de “namorá-la” toda vez que passava na sua frente. Dulce mostrou-lhe a casa, advertindo, desde logo, que ela iria se decepcionar, pois a casa era modesta e não tinha qualquer atração especial; mostrou-lhe a simplicidade da casa, percorrendo com ela todos os seus cômodos. Encerrada a “visita”, a moça agradeceu o que considerou uma gentileza e lhe fez uma singela e espantosa pergunta: “A senhora não tem um filho, pra eu casar com ele e vir morar aqui”?, ao que Dulce lhe respondeu com toda a sinceridade que lhe era peculiar: “Nem invente, que você sai perdendo!”

 

A força da singularidade dos casos que a casa, recalcitrante, oferece; a história de quase 70 anos de convivência regular do casal e dos descendentes (filhos, netos e bisnetos), inclusive aderentes; o apego e carinho que todos sempre lhe dedicaram; a exultante alegria que revestiu a compreensão de todos os netos que transformaram o fato em festa; a generosidade e desprendimento de meu filho Pedro Leonardo que, junto com minha querida nora Malú, demonstraram ao aceitar todas as restrições impostas pela doação, como a reserva de usufruto, antecipação da legítima parte, e o encargo de preservá-la em sua forma atual, etc.; firmaram minha disposição, junto com Dulce, de criar uma regular permanência da “CASINHA DE DR. IVAN”, preservando sua inteireza física, arquitetônica, estrutural, perante algumas gerações atuais e vindouras.

 

Os sonhos despertos; as visões idealizadas; os desejos imaginados; as soluções arquitetadas; as decisões tomadas na busca incessante pela preservação das coisas boas da vida que nos fazem bem e alegria, e nos induz a repelir o conformismo da aceitação das esquisitices de uma falsa modernidade; e a constatação do manifesto inconformismo da população de Garanhuns, pela destruição de alguns imóveis referenciais de nossa terra.

 



                     Ivan e seu filho, Pedro Leonardo

Porque deveríamos aceitar, como inexorável, a destruição das coisas bonitas, singelas e simples do nosso quotidiano, através da inútil intenção de uma falsa modernidade? Não encontro bem estar nos espigões, nas escadas rolantes sem fim, nem adereços modernosos; considero uma maravilha as facilidades da tecnologia, mas não me escravizo aos seus condicionamentos; não me sensibilizo com comidas enfeitadas “de capa de revista”, impostas pelos “chefs” famosos; já vivi quase 90 anos com opções definidas por uma vida despojada e de poucas ambições materiais; uma vigilância atenta para descobrir e assegurar a beleza das simplicidades que fazem a VIDA BELA e me conferem a situação de ser um HOMEM FELIZ, como diria meu velho pai ZéBatatinha, a despeito de todas as agruras e dissabores que enfrentamos no dia a dia.

 

Por todas essas razões é que queremos avisar aos parentes, amigos e a todos que nos conhecem: Já firmamos a necessária escritura pública estabelecendo uma decisão da família, agora consolidada: a “CASINHA DE DR. IVAN”, NA PRAÇA SOUTO FILHO Nº 71, GARANHUNS, doravante não poderá ser alterada, nem modificada, e, muito menos derrubada, para garantir - como concretas e permanentes - as imagens do sonho de um velho maluco e de sua abençoada família (Ivan, Dulce, os filhos Pedro Leonardo e José Ivan (aonde estiver!), os netos Felipe, Marcelo, Cesar, Maria Laura, Ivan Neto, Danilo, Erica, Sofia, Clara e os bisnetos Maria Alice, Rebeca, Caio, Lara Giovana, Marina, Maria Clara e Hugo).

 

A casinha da Praça Souto Filho foi tombada pela família e todos nós esperamos que, durante muitos e muitos anos além, a imagem acima seja mantida incólume.


segunda-feira, 9 de agosto de 2021

Ser Pai - João Marques


 






Pai é geração e amparo. É saber que passa, e, muito mais, é exemplo. É correção, nunca destruição, e realização pessoal pelo triunfo do filho. É a reunião de sua mão à mão direita da mãe. E, na ausência de mãe, as duas mãos, com a força dos braços.


A emergência da figura do pai - Michel Zaidan


 





A emergência da figura paterna, em nossa civilização, é tardia. As sociedades primitivas eram matriarcais. A educação das crianças era entregue ao tio materno, e o pai biológico não tinha ascendência sobre os filhos naturais. A concepção biológica dos filhos e filhas era atribuída aos espíritos que, periodicamente, fecundavam as mulheres. A descendência era matrilinear. As mulheres mandavam; os homens obedeciam. Até o surgimento da família monogâmica e patriarcal, as coisas continuaram assim. A partir da ciência do seu concurso genético, os homens passaram a mandar.  Em lugar do afeto e do cuidado, surgiu o temor e a obediência. O amor paterno passou a ser condicionado pela certeza genética dos filhos. Instituiu-se a monogamia, o incesto e o tabu da virgindade. Da horda, passamos à família patriarcal, com a sujeição da mulher, dos homens e da natureza. O ser-do-cuidado, que caracteriza a essência do amor aos filhos, as pessoas e a natureza é de índole feminina, não masculina. E a evolução psicológica da humanidade passou pelo assassinato psicanalítico da figura paterna e a superação do sentimento de culpa dos filhos.

Mas perdurou na espécie como memória do parricídio original. De lá para cá tornou-se o complexo de édipo que se trasladou nas ditaduras e revoluções sem fim. O sentimento ambíguo de amor e ódio dos filhos em relação aos pais levou-nos ora a amá-los e admira-los. Ora a querermos substitui-los.

A civilização do futuro deve  diluir   a figura paterna nas relações  de amor e cuidado de uns com os outros. Produzindo uma civilização mais feminina, a par das mudanças que vem ocorrendo com a própria organização familiar: famílias monoparentais, homossexuais, comunitárias, A figura paterna será relativizada em prol de uma comunidade afetiva que cuide e proteja todas as crianças, não só nossos filhos.


sexta-feira, 6 de agosto de 2021

A presença - João Marques


 







Estar plenamente presente na vida é permanecer com toda existência. Tudo está no tempo e no espaço. Em qualquer lugar do mundo, visível ou não. Há de estar no pensamento, na lembrança, em alguma forma de conscientização, pelo menos. São muitas as dimensões que refletem a existência, e podem ser percebidas através da mente e da alma. Como no sonho, o que se sonha é uma forma de presença. E para esse domínio, real ou transcendente, ou quaisquer que sejam as suas manifestações, é preciso viver, presente, com o espírito profuso, de todas as coisas da vida.

quarta-feira, 4 de agosto de 2021

OS ELEMENTOS DO FALAR E ESCREVER - Manoel Neto Teixeira


 







A nossa língua portuguesa, das mais belas e complexas, principal orgulho nacional, é utilizada e exercitada por todas as classes sociais, do campo às grandes e pequenas cidades espalhadas pelos mais de cinco mil municípios em que está dividido/unido esse continente chamado Brasil.

            É imensurável a contribuição que os estudiosos de nossa língua, chamados de filólogos, têm dado ao país e a cada brasileiro, sobre como falar e escrever seguindo os fundamentos da nossa língua: sintaxe, etimologia, prosódia e ortografia.

            Esses quatro pilares se desdobram em orações formadas com artigo, nome, pronome, particípio, interjeição, verbo, advérbio, preposição e conjunção. A reunião desses elementos forma as orações, proclamadas oralmente ou por escrito (texto).

            Entre os poucos filólogos que se dedicaram ao estudo e sistematização da nossa língua, destaca-se o professor Levino Epaminondas de França, de saudosa memória, autor da obra PORTUGUÊS EM PINGOS DE ANÁLISE SINTÁTICA, edição de 1971 do Colégio Diocesano de Garanhuns, onde o autor ensinava Latim e Português. O prefácio dessa obra é do então diretor do Colégio, Mons. Adelmar da Mota Valença.

            Essa obra tem alcance didático e está a reclamar uma nova edição, procedendo-se à atualização conforme as últimas reformas de nossa língua. O autor inicia seu trabalho (193 páginas) discorrendo sobre a oração, que se compõe de termos essenciais, integrantes e termos acessórios. No primeiro encontram-se o sujeito e o predicado; sujeito simples, composto e indeterminado. Porém, existe a oração sem sujeito.

            Predicado: nominal, verbal e verbo-nominal;

            Predicativo: do sujeito e do objeto.

            Os termos integrantes da oração são: complemento nominal, complemento verbal e agente da passiva. O objeto pode ser direto e indireto.

            Os termos acessórios da oração são: adjunto adnominal, adjunto adverbial e aposto.

            Na primeira parte de sua obra o prof. Epaminondas diz que o pensamento é uma fonte poderosa de poder. O homem pensa, transforma o pensamento em palavras e as palavras em ação ou trabalho.

            E acrescenta: transmitimos a nossos semelhantes os pensamentos, por meio da palavra – falada e escrita.

            A ideia é expressa por um pensamento, ou um grupo de pensamentos. Ex.: “O homem educado tem mais valor”. A ideia do valor de um homem educado foi expressa e compreendida por um só pensamento.

            Às vezes, porém, é preciso mais de um pensamento para maior clareza da ideia. Ex.: “Eles foram verdadeiros heróis, porque vieram para a cidade, a fim de educar os filhos”.

            Para que a ideia desse heroísmo tenha o seu verdadeiro valor, são necessários três pensamentos: 1- eles foram verdadeiros heróis; 2 - porque vieram para a cidade; 3 - a fim de educar os filhos.

            O verbo é como que a alma do pensamento. Se cada pensamento forma uma oração, cada oração possui um verbo; sem verbo não haverá pensamento, não haverá oração.

            Oração é a expressão do pensamento, por meio da palavra – falada ou escrita.

            Vários são os movimentos do espírito.

            Tudo quanto dizemos (falando ou escrevendo) é sempre o resultado de uma ideia que tivemos, ou de alguma observação que fizemos.

            Quando estamos alegres, o pensamento surge sobre coisas boas e as recordações são sempre agradáveis. Por estas razões, o pensamento, a palavra e o trabalho dependem muito do estado de espírito de quem pensa, fala, escreve, ou desempenha qualquer trabalho”.

                        (Manoel Neto Teixeira, autor, dentre outras, da obra GARANHUNS – ÁLBUM DO NOVO MILÊNIO (1811-2016), é membro da Academia Pernambucana de Letras Jurídicas). E-mail: polysneto@yahoo.com.br


A grande disputa - Aninha Marques


 






As pessoas estão brigando por tudo e tudo virou disputa! Quem tem mais razão, quem tem os melhores argumentos, quem é mais elogiado, quem tem mais audiência, quem recebe mais curtidas e assim segue a lista. A ausência da paz interior torna tudo uma disputa de egos e quando alguém não consegue ser o melhor, se sente frustrado e ansioso, já pensando no próximo passo, na próxima investida e o que fazer para ser ou continuar sendo "o melhor!" A competição e a vaidade são máquinas de fazer tristeza, e pouco a pouco, o vazio da alma adoece o corpo.

segunda-feira, 2 de agosto de 2021

Habeas Corpus da Idade - MERALDO ZISMAN MÉDICO PSICOTERAPEUTA.


 






Alcancei a idade de 87 anos. De que valeria alcançar esta idade, se toda sabedoria do Mundo fosse uma tolice? Atingi o estágio da vida em que posso me dar ao luxo de dizer o que penso, sem temer pelo que possa acontecer com a minha biografia.

Começo dizendo: repudio a condição do velho que somente se faz estimável pela sua longevidade. Poucas pessoas sabem ser velhas. Não devemos levar as nossas falhas juvenis para a velhice, a velhice traz com ela seus próprios defeitos Os velhos têm pouca memória, mas em troca adquiriram bom senso e prudências aprendidas ao longo da vida.
Aos jovens dou um conselho (apesar de dizerem por aí que conselho de velho é como o sol de inverno, aclara sem esquentar):

 “Torna-te velho cedo, se quiser ser velho por muito tempo (Cícero [106 – 49 a.C.] Da velhice, X.)”.

Irrito-me quando um jovem, pensando ser “politicamente correto”, começa a me tratar com muitos cuidados. Por favor, deixe-me fazer o que entendo: cometer imprudências, desobedecer, brincar, falar sem censura e outras coisas mais. Desde que não me torne em um velho ridículo; difícil, pois já entendi também o meu lugar social. Além disso, velho que não tem juízo nunca o teve.

Permitam-me falar desta vez, mesmo sem autorização da maioria do meu grupo etário, aos que se julgam jovens e tudo saber: liberte-nos de vossas fatigantes e asfixiantes bondades. Esses seus cuidados são temores que machucam. Vocês precisam entender que não somos velhos enquanto buscamos viver como todo mundo. Nós podemos pegar coisas pesadas, sim, podemos raciocinar corretamente, sim. Não fossem as lembranças da mocidade, os velhos não se ressentiriam da velhice.


O nosso mal-estar reside em não poder fazer mais o que fazíamos outrora. E vocês se esquecem de que idosos sadios são criaturas tão perfeitas quanto os moços saudáveis.  E lembrem-se todos: os velhos morrem quando não são mais amados.

Procure-nos. Desejamos conversar com todos vocês de todas as idades. Pois, já fomos jovens e também pensávamos como vocês — de tudo saber.

Vocês jovens podem ser muito espertos e rápidos nesses tempos da computação, mas não têm nossa experiência. Temos muito para lhes ensinar. Se a velhice é uma segunda infância é prudente saber que  A criança é o pai do Homem.


 Estou às ordens. Basta procurar-me. Velho sabido espera a visita dos jovens que nunca vão procurar-me, primeiro.  Não obstante, confesso.
Mas que saudades das horas loucas da mocidade!  Mesmo sem a proteção de habeas “corpus”.