terça-feira, 18 de maio de 2021

FIM DO JORNAL IMPRESSO - Manoel Neto Teixeira

 








Uma das invenções mais significativas e abrangentes da história da humanidade foi sem dúvida a imprensa tipográfica, pelas mãos do sábio alemão Johann Gutenberg, década de 1430, assinalando a passagem da Idade Média para a Idade Moderna.

Com a invenção dos tipos móveis surge a máquina tipográfica (impressora) e daí a reprodução da palavra, frases e textos em forma de livros, sendo a bíblia o primeiro a ser impresso, conforme os registros. A invenção de Gutenberg foi tão revolucionária que só pode ser comparada ao surgimento agora do computador e da reprodução digital da escrita, na opinião de estudiosos da matéria.

A invenção da imprensa foi utilizada como ferramenta básica nas transformações que marcariam o Renascimento, nos seus múltiplos aspectos, lastreando a passagem para a modernidade.

Além da impressão do texto bíblico, tal como o conhecemos até hoje, a imprensa foi utilizada como meio para a Reforma Protestante, no século XVI. Verdadeira revolução no terreno da escrita e da leitura, com a produção de textos diversos, motivando o confronto de ideias e concepções sobre o universo e a vida – vegetal e animal (onde se inclui o homem como ser racional).

A escrita até então restringia-se a modos de réplica muito limitados, como as tabuinhas com escrita cuneiforme dos povos sumérios, os papiros egípcios, os ideogramas chineses, entre outras formas de reprodução, cujo acesso era restrito a pequenos grupos de pessoas, geralmente ligadas aos palácios imperiais.

Fazia-se um molde com os caracteres móveis e, a partir dele, imprimiam-se quantas cópias o estoque de tinta, à base de óleo, suportasse. O nome que passou a ser dado ao conjunto de papeis impressos em caracteres móveis foi códice, do Latim, códex.

 Com as máquinas de impressão tipográficas tivemos a proliferação de periódicos – jornais, revistas, livros e tantos outros impressos, ensejando o surgimento de atividades e profissões – gráficos, jornalistas, editores, revisores, tipógrafos, em todos os recantos do planeta. Passam os periódicos a ser instrumentos indispensáveis aos regimes políticos em geral, de modo especial às democracias representativas, como é o caso do Brasil.

A imprensa é classificada como “o quarto poder”, ao lado do Executivo, Legislativo e Judiciário, conforme ocorre em todos os regimes democráticos. É imensurável a sua contribuição ao desenvolvimento das relações sociais, das ciências, das artes, da literatura e demais formas de comunicação entre os povos.

Mas a inventividade do homem não tem limites, eis que de tempos em tempos vão surgindo novas técnicas e instrumentos de comunicação e de produção nos diversos setores de atividades, dos campos às cidades, acrescentando, quando não suprimindo, antigas práticas. Assistimos, agora, melancólica e tristemente, ao fim dos jornais impressos, de canto a canto do país, dando vez à comunicação eletrônica, com a informática e a internet.

Após concluir os estudos básicos e o segundo ciclo (Clássico) no Diocesano de Garanhuns, 1965, ano do cinquentenário do nosso “Gigante da Praça da Bandeira”, como era por todos – alunos e professores – proclamado esse educandário, dirigido por 44 anos ininterruptos por Mons. Adelmar da Mota Valença, transferi-me para o Recife a fim de realizar meus estudos universitários. Era 1966, quando fiz o vestibular para a Faculdade de Jornalismo da Universidade Católica. Ao mesmo tempo, submeti-me a um “teste” para atuar como repórter do Diário de Pernambuco, pelas mão e olhar atento do diretor, jornalista Antônio Camelo (de saudosa memória).

Feliz início, para mim, pois levava a cabo o estudo teórico na Faculdade e a prática no meu dia a dia de repórter do DP. Conclui Jornalismo em 1968, naquela turma de tantos amigos e companheiros como Jones Figueiredo Alves, Marcílio Viana Luna, Antônio Martins, Jones Melo, padres Florisval e Hildebrando, entre outros. A secretária da Faculdade, à época, Wânia Nóbrega, jovem de apenas 15 anos, hoje, por ironia do destino, minha companheira.

A profissão de jornalista no Brasil só veio a ser regulamentada em 1969. Até aí podia-se trabalhar nas redações dos jornais e revistas sem o diploma universitário. Pois bem, desde então me acostumei a ler jornal impresso como a primeira atividade do dia, principalmente o velho/novo DP, conferindo o tratamento que o editor havia dado, dia anterior, aos meus textos (notícias e reportagens). Agora, órfão dessa leitura, tenho que conviver e me inserir às novas formas (online) de leitura. O fim dos jornais impressos no Brasil segue um imperativo capitalista, além, claro, da força transformadora da internet.

Para mim, a morte (anunciada) concretizou-se na manhã daquele sábado da última semana de abril de 2021, quando me dirigi à banca para adquirir o jornal impresso e recebi a triste notícia de que os jornais impressos (Diário de Pernambuco, Jornal do Commercio e Folha de Pernambuco) saíram definitivamente de circulação.

Tenho, pois, motivos pessoais para fazer este registro, meu desencanto com o fim dos jornais impressos: ainda adolescente em Garanhuns já experimentava o fascínio de ver, nas oficinas do jornal O MONITOR, do qual me tornaria colaborador, apesar da pouca idade, o manuseio dos tipos móveis na formação de cada palavra, frases e parágrafos, compondo as notícias, reportagens e artigos dos profissionais e colaboradores desse veículo. Sensação que se ampliaria ao me transferir para o Recife e iniciar minhas atividades de repórter do DIÁRIO DE PERNAMBUCO, início de 1967.

O parque gráfico do DP ocupava todo o primeiro andar do histórico prédio da Praça da Independência (Pracinha). Quantas vezes lá comparecíamos para dirimir dúvidas sobre esse ou aquele texto, preparados por cada profissional, na redação (ocupávamos todo o segundo andar do edifício), sob a supervisão dos editores. Foram 20 anos (1967/87) de militância como repórter, revisor de originais e editor de texto do DP, certamente minha principal “academia” como trabalhador da comunicação social. Tempo inesquecível: o companheirismo, amizades, aprendizagens, sonhos e emoções, divididos/somados com nomes de expressão do jornalismo e da própria cultura pernambucana.

Qual não era a emoção ao manusear cada edição, que começava a circular em plena madrugada do novo dia, trazendo nossas matérias e dos companheiros, bem como as que chegavam através das agências de notícias, nacionais e internacionais, os telégrafos. Impressas em cada edição do nosso DP, o mais antigo em circulação da América Latina (07-09-1825). Esquecer tudo isso não é fácil, com todo respeito às novas ferramentas. Década de 80, vivenciamos a mudança das linotipos para o offset. Mas agora, tudo é diferente, do texto impresso para a leitura online. Não é fácil acostumar.

                        (Manoel Neto Teixeira, autor, dentre outras publicações, da coleção MULTIVISÃO, com VIII volumes, é membro da Academia Pernambucana de Letras Jurídicas). E-mail: polysneto@yahoo.com.br

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